Comentário da Promotora de Justiça do Estado do Pará, Ana Maria, sobre as declarações críticas do Delegado de Polícia Civil do Pará, Arnaldo José de Oliveira Mendes, sobre a apreensão em flagrante, pela quinta vez e pela mesma conduta descrita como crime, de um adolescente infrator em Belém/PA.
A respeito das declarações do Delegado, digo que ele não precisava se desculpar porque ele não ofendeu ninguém. Ele apenas fez uma crítica ao sistema, à forma como a questão do menor envolvido com assalto vem sendo conduzida pelos profissionais que trabalham na area da infancia e da juventude.
Se alguém tomou como ofensa a cobrança do Delegado, foi um excesso. Ele não citou nomes e nem disse que a conduta de A ou B foi errada, mas apenas perguntou se nada podia ser feito para evitar que um menor que é apreendido pela quinta vez cometendo um ato infracional, armado com revólver e em concurso com outro assaltante, continue oferecendo risco para ele mesmo e para a sociedade.
No estado democrático de direito toda e qualquer autoridade pública está sujeita a ser criticada e cobrada em sua atuação: é o que se chama de acountability. Não existe ofensa nenhuma nisso, mas infelizmente o autoritarismo do passado ainda nos impulsiona a manter a crítica sob mordaça.
Ora, só um cego intelectual não vê que aqui em Belém está havendo um extermínio de jovens infratores envolvidos com drogas e assaltos. E só um cego não vê que a cada dia cresce o número de adolescentes que assaltam a mão armada. Então, basta somar 1 + 1 para concluir que o sistema não está funcionando e deve ser discutido, pensado, melhorado, mudado. Não significa que A ou B juiz esteja errado ou não esteja trabalhando. A pessoa pode estar virando dia e noite, debruçada sobre os processos, mas um ponto importante todos devemos admitir: todo esse arduo trabalho não está surtindo bons resultados.
O que ocorre é que, no processo envolvendo menores em conflito com a lei, a maioria dos profissionais do sistema atua segundo o entendimento dominante - protecionista, que não cobra nenhuma responsabilidade do menor pois o vê apenas como vítima e como tal deve ser tratado. As condições precárias de instrumentos para uma atuação mais eficaz na recuperação desses jovens não é colocada como um ponto fundamental.
Quem trabalha com essa matéria deveria admitir que a situação está pior. Deveria, ainda engrossar o coro dos que compreendem que algo precisa ser feito imediatamente.
Onde está a ofensa em dizer que o sistema apresenta graves distorções? O que fazer com quem é flagrado pela quinta vez assaltando à mão armada? Ah, então, para não ofender vamos dizer que está tudo bem e vamos fazer de conta que não está havendo um escandaloso aumento de jovens envolvidos com assalto e drogas, e que esses jovens estão sendo assassinados e também assassinando inocentes? Assim, não ferimos suscetibilidades, mas temos que suportar o avanço do problema calados.
O raciocínio é lógico e direto: os profissionais que trabalham com a questão dos infratores dizem que estão fazendo um grande trabalho, tão grande que sequer aceitam uma criticazinha proferida no calor da rua, da atividade policial; no entanto, apesar de todo esse arduo esforço, a coisa está pior a cada dia tanto para a população (em risco nas mãos dos assaltantes adolescentes) tanto para os próprios assaltantes (porque estão sendo assassinados, exterminados). Em meio a essa situação gravíssima, um Delegado de Polícia não pode sequer questionar o sistema?
Ora, se é evidente que o status quo é desfavorável tanto para sociedade quanto para os próprios menores infratores, por que não se pode constestar a forma como vem sendo conduzido o problema e até a própria legislação? Voltou a época da ditadura em que nenhuma ação do Estado podia ser contestada?
Espero que a corregedoria de polícia civil seja justa e não puna um policial apenas porque ele usou de um direito elementar de cidadania que é o de contestar um sistema que se percebe falido em por isso, precisa ser reformulado. Não há ofensa nenhuma nisso. Ao contrário, acho que deveríamos realizar um fórum para debater a questão do menor infrator. Mas tal evento não pode ser dominado só pelo discurso protecionista, assistencialista e que exclui toda e qualquer responsabilidade do jovem para distribuí-la pelos ombros da sociedade, conforme vem sendo adotado por muitos psicólogos e assistentes sociais e que foi incorporado por diversos Juizes e Promotores.
Se falarmos, debatermos, opinarmos quem ganha é a sociedade. Com a "lei da mordaça" quem perde também somos todos nós.
O problema é nosso, de forma que o Delegado, por tratar-se de autoridade pública diretamente envolvida com a segurança, tem toda razão em estar preocupado e pugnar por mudanças. Que mudanças? Esse é o ponto do debate.
Fonte: Blog da Ana Maria
Comentário do 'Kabukão':
Parente, não sou letrado pra falar sobre o assunto, mas te digo uma coisa, esses pirralhos são aborrecentes mesmos...
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